História
de Vinicius Diniz Rosa© -
A eternidade
Ao som de uma caixinha de música senhor Marcos estava sentado em sua poltrona de couro, debruçado em seus livros, mas não tão interessado como já fora um dia, apenas ali sentado olhando e olhando as capas, parecia procurar algo como um diário ou álbum de fotografias.
Ele olhava, olhava o teto, mexia nos livros, abria as gavetas de sua mesa, mas
não achava nada, apenas vi ali seus livros e nada mais, uma montanha deles com
palavras de todo o tipo desde rancores as mais amorosas, ele olhava, olhava
entre aquele universo em definições, de definições que iam contra até as
próprias definições e não encontrava um resquício de sua memória, de sua
história, não achava foto alguma de momento algum, registro algum de momento
algum que fosse seu, ele ia se desesperando, pois ele queria essa alavanca para
a memória, ele queria chorar de emoção ao ver um velho retrato de sua juventude
dourada, mas ali só tinha as lembranças e as histórias de outros, do mundo
inteiro, ali só tinha as revoltas e alegrias de outros, nada que fosse dele,
nada que ele construiu, então ele parou de procurar, jogou os livros no chão
sem nenhum rancor, pegou uma pena fina e começou a escrever sua história.
Colocando no papel cada vago momento que surgia em sua mente, os nãos e os sins
que disse para a vida, as mágoas, as separações, as perdas, as vitórias, tudo
ele foi jogando no papel, algumas passagem escrevia com uma velocidade
impressionante, outras, ah demorava o tempo que fora preciso, até que então
termina, olha aquela pequena pilha de folhas, dá um sorriso se ajeita na
cadeira e morre com um grito suave envolvido de risos.
A criança que adotará corre para o escritório, toca na pele fria do rosto do
seu pai adotivo e começa a chorar sem demora alguma, a criança olha para a
pilha de folhas e começa a ler cada palavra ali escrita, as verdades e as
mentiras que contará e descobre que seu pai também perdeu o pai dele, que
perdeu o pai dele e assim por diante, mas todos estavam ali pintado nos
quadros, nas palavras de cada livro, tão fortes como quando estiveram vivos,
com seus corpos dilacerados e almas ao céu, com os segredos revelados... O
garoto não chorava mais e apenas ria do ocorrido, ele olhou o corpo do pai
afogado na cadeira e não se importou com sua paralisia, pois a morte não tem o
poder de matar palavras, mesmo que a elas o tempo faça o trabalho de deixar
confusas, e as últimas palavras que o menino leu naquela pilha de lembranças
foi:
- Não pode mais me ver, nem mais me sentir, não emito sons, nem posso mais
dançar ou ensinar, mas deixo registrado aqui e o que se registra não se apaga,
que o dia mais feliz de minha vida, foi entrar em um acabado orfanato e ver o
rosto de um garoto abandonado tão turrão quanto eu, naquela hora eu descobri
que minha missão era cuidar dessa criança, e hoje eu estou com ela nós seus 14
anos, mas estou morrendo, mas nada matará essa felicidade e esse amor e sempre
que alguém lê, ou até ele mesmo ler isso, ele saberá que há um fantasma a sua
sombra, ajudando seu anjo.
O menino sorrio e saiu da sala mórbida, fechou a porta, pegou o telefone ligou
para a parentada dando a notícia, ninguém quis ficar com o garoto depois de
todos os afazeres do enterro resolvidos, o entregaram de volta para um
orfanato, claro que ele levou aquela pilha de folhas com ele e lia aquilo com afinco
todos os dias, se regando da eternidade das belas palavras e como uma bela flor
foi crescendo, crescendo e crescendo, até se tornar importante no orfanato em
que vivi e fazer dele o melhor lar para as crianças ali abandonadas ou de fato
órfãos.
História de Vinicius Diniz
Rosa© - A eternidade
Nenhum comentário:
Postar um comentário