Procurar pode, achar é outra história...

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

A eternidade

História de Vinicius Diniz Rosa©  - A eternidade
     
           Ao som de uma caixinha de música senhor Marcos estava sentado em sua poltrona de couro, debruçado em seus livros, mas não tão interessado como já fora um dia, apenas ali sentado olhando e olhando as capas, parecia procurar algo como um diário ou álbum de fotografias.
 
             Ele olhava, olhava o teto, mexia nos livros, abria as gavetas de sua mesa, mas não achava nada, apenas vi ali seus livros e nada mais, uma montanha deles com palavras de todo o tipo desde rancores as mais amorosas, ele olhava, olhava entre aquele universo em definições, de definições que iam contra até as próprias definições e não encontrava um resquício de sua memória, de sua história, não achava foto alguma de momento algum, registro algum de momento algum que fosse seu, ele ia se desesperando, pois ele queria essa alavanca para a memória, ele queria chorar de emoção ao ver um velho retrato de sua juventude dourada, mas ali só tinha as lembranças e as histórias de outros, do mundo inteiro, ali só tinha as revoltas e alegrias de outros, nada que fosse dele, nada que ele construiu, então ele parou de procurar, jogou os livros no chão sem nenhum rancor, pegou uma pena fina e começou a escrever sua história. 
              Colocando no papel cada vago momento que surgia em sua mente, os nãos e os sins que disse para a vida, as mágoas, as separações, as perdas, as vitórias, tudo ele foi jogando no papel, algumas passagem escrevia com uma velocidade impressionante, outras, ah demorava o tempo que fora preciso, até que então termina, olha aquela pequena pilha de folhas, dá um sorriso se ajeita na cadeira e morre com um grito suave envolvido de risos. 
            A criança que adotará corre para o escritório, toca na pele fria do rosto do seu pai adotivo e começa a chorar sem demora alguma, a criança olha para a pilha de folhas e começa a ler cada palavra ali escrita, as verdades e as mentiras que contará e descobre que seu pai também perdeu o pai dele, que perdeu o pai dele e assim por diante, mas todos estavam ali pintado nos quadros, nas palavras de cada livro, tão fortes como quando estiveram vivos, com seus corpos dilacerados e almas ao céu, com os segredos revelados... O garoto não chorava mais e apenas ria do ocorrido, ele olhou o corpo do pai afogado na cadeira e não se importou com sua paralisia, pois a morte não tem o poder de matar palavras, mesmo que a elas o tempo faça o trabalho de deixar confusas, e as últimas palavras que o menino leu naquela pilha de lembranças foi: 
           - Não pode mais me ver, nem mais me sentir, não emito sons, nem posso mais dançar ou ensinar, mas deixo registrado aqui e o que se registra não se apaga, que o dia mais feliz de minha vida, foi entrar em um acabado orfanato e ver o rosto de um garoto abandonado tão turrão quanto eu, naquela hora eu descobri que minha missão era cuidar dessa criança, e hoje eu estou com ela nós seus 14 anos, mas estou morrendo, mas nada matará essa felicidade e esse amor e sempre que alguém lê, ou até ele mesmo ler isso, ele saberá que há um fantasma a sua sombra, ajudando seu anjo. 
          O menino sorrio e saiu da sala mórbida, fechou a porta, pegou o telefone ligou para a parentada dando a notícia, ninguém quis ficar com o garoto depois de todos os afazeres do enterro resolvidos, o entregaram de volta para um orfanato, claro que ele levou aquela pilha de folhas com ele e lia aquilo com afinco todos os dias, se regando da eternidade das belas palavras e como uma bela flor foi crescendo, crescendo e crescendo, até se tornar importante no orfanato em que vivi e fazer dele o melhor lar para as crianças ali abandonadas ou de fato órfãos.

História de Vinicius Diniz Rosa©  - A eternidade

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